A hemorragia econômica da demagogia petrolífera


O petróleo, um dos insumos mais importantes da economia, utilizado na produção de asfalto, combustíveis, cosméticos e até remédios, tem tido a sua gestão perigosamente centralizada por grupos obscuros sem comprometimento com o uso autossustentado e verdadeiramente produtivo da commodity, não só no Brasil, como também no mundo. Enquanto no cenário brasileiro há o controle quase pleno da atuação dos subsetores e da precificação do produto, por meio da Petrobras, tratada como extensão do populismo governamental; em âmbito internacional há o cartel da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), detentor de cerca de 80% das reservas mundiais de petróleo e gerido majoritariamente por ditaduras, que exercem grande influência no preço internacional.

A trajetória do tratamento às fontes de energia no Brasil, a partir da ditadura do Estado Novo, em 1937, se constituiu brutalmente centralizado no Estado, mediante a separação dos direitos de propriedade do solo e do subsolo, a nacionalização sumária das reservas energéticas e o controle monopolizado garantido constitucionalmente. Em 1953 foi instituído por lei o monopólio oficial do petróleo, atrelado ao CNP (Conselho Nacional do Petróleo) e por intermédio da recém-criada Petrobras. A flexibilização de tão rígida política se deu por necessidades conjunturais arrebatadoras, e não por convicções ideológicas ou afins, havendo a abertura para contratos de risco, (concessão de direitos de exploração de petróleo atrelada ao pagamento de tributos e royalties) durante a crise da década de 70 (com a disparada do preço da commodity gerada pela guerra do Yom Kippur, que pôs em risco a disponibilidade de sua oferta no mundo), e uma maior abertura para a participação de outras empresas na atividade exploratória a partir de 1995, mediante emendas constitucionais que relativizaram o monopólio estatal (tendo em vista a busca voraz do governo pela contenção dos gastos públicos, que constituíam um rombo fiscal inviabilizador do plano real). Já nos anos 2000, foi implantada uma política de preços subsidiados para os combustíveis, com o intuito de desacelerar a inflação (levando em consideração que tal insumo é presente em toda a cadeia produtiva). Esta medida acarretou em prejuízos descomunais para a Petrobras (entre 2007 e 2014, as perdas de receita da empresa chegaram a 56,5 bilhões de dólares, comparando com o preço de referência internacional), que não pareava o preço interno com o preço de importação, nem tampouco com o praticado internacionalmente.

Como se não bastasse a incidência desses erros crassos, reflexos de uma mentalidade populista e estatista, somou-se ao periclitante cenário um efeito recorrente da administração estatal: a falta de escrutínio de seus gestores para com as necessidades reais de tomada de decisão para garantir a eficiência da empresa. Detendo grande percentual de participação nos subsetores (chegando a 98% no refino) e realizando uma política de preços inviável para seus concorrentes, obteve fatia de mercado ainda maior no setor interno, no entanto, não conseguiu atender a demanda nacional por combustíveis (não apenas por gasolina, como também por diesel e gás liquefeito de petróleo), tornando-se dependente de importações e mais sujeita às oscilações internacionais. E ainda, como agravante, o aumento da frota de veículos flex fuel no país gerou um maior crescimento na demanda por gasolina, desacompanhado de disponibilidade suficiente de oferta interna.

Ao observar a composição do preço dos combustíveis derivados do petróleo ofertados pela Petrobras (em termos da origem dos custos), percebe-se que há participação severa de impostos, principalmente sobre a gasolina, chegando a 45% (somados impostos federais e estaduais). O Estado drena as finanças do consumidor a pretexto de fazer políticas públicas, porém, em termos de retorno à sociedade, é o último colocado entre os 30 países que mais arrecadam em proporção ao PIB, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (e mesmo que proporcionasse bom retorno, seria a alto custo de oportunidade, tendo em vista que o mercado tende a alocar mais eficientemente os recursos escassos da sociedade). Uma das consequências de tal desarranjo é ocorrência de escândalos de corrupção, extremamente danosos à credibilidade institucional do país e às finanças públicas, como se viu no caso da Petrobras, onde estima-se que cerca de 88 bilhões de reais foram desviados (ainda inferior aos prejuízos gerados pela política de preços subsidiados).

Estando inserido num grave cenário, com mazelas drasticamente enraizadas, faz-se urgentemente necessária a adoção de uma postura lúcida para com a escolha da atitude a ser tomada. A decisão de seguir os preços internacionais ou dar independência à cúpula administrativa das empresas estatais apenas maquia o problema, pois, enquanto tais instituições mantiverem o vínculo com o setor público, estarão invariavelmente maculadas por constante imprevisibilidade, podendo a qualquer momento carecer de reta governança corporativa para servir aos interesses escusos atrelados aos ciclos eleitorais, inerentes à democracia. É preciso romper com o modelo contaminado pelo mecanismo de incentivos corrosivo da ação estatal, reduzindo ao máximo as amarras regulatórias que barram a entrada de novos concorrentes e endossam oligopólios (com poucas empresas que possam arcar com os custos impostos), que incentivam os tão incômodos cartéis. A abertura do mercado possibilita que haja maior concorrência nos subsetores, aumentando a produtividade, a disponibilidade de oferta e, por conseguinte, baixando os preços. A desregulação deve ser deflagrada em conjunto com a redução da taxação tributária, que virá de forma consistente apenas se houver redução significativa dos gastos do governo, caso contrário, ocorrerá apenas o repasse do ônus para outros segmentos da economia, criando a ilusão de melhoria. Protestos e manifestações voltados para benefícios específicos a alguma classe social são nocivos ao objetivo central, que passa pela conscientização geral em prol do boicote às políticas estatais de gastos e atuação econômica excessivos.


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