Bettina e os oligarcas da poupança


No mundo moderno e globalizado no qual vivemos, as formas de trabalho e fontes de renda têm se aprimorado cada vez mais. A divisão do trabalho e a especialização, conceitos caros aos mercados eficientes, foram em muito transbordados pela economia compartilhada, impulsionada pela internet cada vez mais acessível e dinâmica. Apesar de tão favoráveis fatores, bolhas de ineficiência têm se formado e se consolidado em setores de mercado por meio da imposição de barreiras burocráticas, regulatórias e até mesmo midiáticas, impedindo que os agentes econômicos otimizem o custo-benefício, ou risco-retorno, e gerando assimetria informacional.

Uma economia cujos setores-chave, como petrolífero, energético e financeiro, são blindados de novos concorrentes, tanto externos quanto internos, padece de atrofiamento da produtividade e tem seus recursos escassos subutilizados. Um dos motivos pelos quais a economia brasileira é bastante lenta em seus processos de recuperação é a influência excessiva, sobre a inflação, dos preços controlados pelo governo, que, por se dar em insumos indispensáveis da atividade produtiva nacional, afeta os preços dos bens e serviços finais de forma severa. O setor financeiro brasileiro, por exemplo, é dominado por poucas instituições e tem grande parte do crédito disponível em poder de bancos estatais, que, para emprestar dinheiro a taxas subsidiadas, abaixo do preço de mercado, a empresas arbitrariamente escolhidas, fazem com que o Banco Central se veja forçado a aumentar, acima do normal, o fluxo entrante de capital no governo a fim de que haja disponibilidade de crédito suficiente para atender a demanda excessiva, ocasionada pelo subsídio, dos financiados privilegiados. Tal mecanismo faz com que a taxa básica de juros (Selic) seja cotada a um patamar acima daquele que haveria de estar em condições normais de equilíbrio de mercado para que possa motivar os investidores a alocar seus recursos no governo em quantidade maior do que aquela que alocariam. Isso leva à elevação das taxas de juros oferecidas pelas instituições financeiras, tendo em vista que os emprestadores se veem no seguinte dilema: emprestar os recursos para o governo com elevada rentabilidade sem riscos ou emprestá-los para seus clientes em geral, cujo risco é razoavelmente alto. Para compensar esse risco, que será atenuado com a aprovação do cadastro positivo, a instituição exige maior retorno, sobretudo porque incorre no problema de seleção adversa, ou seja, não detém meios significativos de averiguar o histórico de seus possíveis clientes, levando-a a aumentar o preço de seu produto para todos e punindo os devedores prudentes. Ademais, as taxas de juros do mercado brasileiro também são bastante altas em virtude de fatores que reduzem a oferta de crédito, como a baixa poupança dos brasileiros em proporção à renda e o elevado percentual de reservas compulsórias, isto é, da fração de recursos a qual o Banco Central bloqueia a movimentação a fim de mitigar o risco de colapso financeiro.

Apesar de todos os elementos causais citados terem sua relevância na desagradável conjuntura econômica do Brasil, o fato de haver um oligopólio no setor financeiro, isto é, poucas empresas concorrendo e blindadas de novos concorrentes por barreiras artificiais, gera malefícios de forma peculiarmente danosa. Os efeitos proporcionados por tal estrutura de mercado perversa excedem seu setor, que é deteriorado pela acomodação dos poucos ofertantes, e afetam profundamente as escolhas políticas dos representantes eleitos e de seus indicados para os órgãos reguladores: o poder concentrado nas instituições financeiras hegemônicas permite que se utilizem de lobby, seja ele velado ou explícito, extremamente excessivo a fim de moldar as regras vigentes à sua preferência, ou seja, propõem, visando ao próprio favorecimento em detrimento da sociedade, vantagens ilícitas aos formuladores das leis.

Os recentes cerceamentos e intimidações praticados contra a empresa Empiricus por suas propagandas constitui um símbolo marcante do sistema que busca isolar os consumidores das variedades de produtos que podem vir a solapar a hegemonia de entidades acomodadas e ineficientes. A rentabilidade medíocre oferecida pela Caderneta de Poupança, nos bancos, que, muitas vezes, se dá por meio do simples repasse dos recursos dos poupadores ao Tesouro Nacional, é de 70% da taxa Selic mais a TR (Taxa Referencial), quando a Selic está a 8,5% (ao ano) ou menos, e de 0,5% ao mês mais TR, quando a Selic está acima de 8,5% (ao ano); e os fundos de investimento ligados aos bancos proporcionam retornos líquidos abaixo da média dos demais fundos. Caso a população aprenda a investir seu próprio dinheiro, algo que não é complicado, as instituições bancárias terão graves perdas e haverão de lidar com concorrentes indiretos, no amplo e diverso mercado de capitais, forçando-as a, entre outros "sacrifícios", baixar seu elevadíssimo spread, isto é, a diferença entre a taxa a qual remunera seus emprestadores e aquela que aufere pelo serviço de intermediação financeira, que hoje, no Brasil, é a segunda maior do mundo, perdendo apenas para Madagascar. O marketing eventualmente "agressivo", que naturalmente está presente em vários outros setores de mercado, é utilizado pelos reguladores como pretexto de fachada para cercear ou barrar novos concorrentes e superdimensionado de forma pejorativa pelos críticos, que creem numa visão paternalista da regulação para "proteger" os consumidores, supostamente incapazes de avaliar suas opções e lidar com o efeito de suas escolhas, inclusive aprendendo com seus erros.

O ato de vender produtos, de qualquer que seja a modalidade, é da natureza humana e contribui profundamente para o progresso da civilização. Os compradores nunca aprimorarão seu senso crítico e sua capacidade analítica se forem barrados do contato natural com a prática tão trivial e corriqueira de propagandear, seja de maneira estritamente fidedigna ou não, bens e serviços. A independência financeira, elo que liga a sociedade ao progresso, possui muitos inimigos, sejam eles conscientes ou involuntários.


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