Da livre iniciativa como fundamento de nossa república

Economia cresce e PIB pode ser uma boa surpresa | Notibras

"Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pela influência, mais que pelo trabalho; e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a honestidade se converte em sacrifício, então poderá afirmar, sem receio de errar, que sua sociedade está condenada." Ayn Rand. A revolta de Atlas. 

É fundamento de nossa República Federativa do Brasil o valor da livre iniciativa. Pressupomos que a livre iniciativa funciona como um aspecto específico do direito à liberdade defendendo o direito do cidadão (per si ou através de pessoas jurídicas) em empreender assumindo riscos individualmente em troca de recompensa baseada no valor dado a seu serviço ou produto no livre mercado. 

Nesse contexto, na esteira das diretrizes constitucionais da ordem econômica, a legislação brasileira projetou, observada a dosimetria indicada na Constituição federal, sob a regência do princípio da livre iniciativa, a atuação (e não a intervenção) do governo em tal importante setor da economia brasileira. 

Entretanto a livre iniciativa prevista vem sendo objeto de ataque em nossos Tribunais. A investida mais recente ocorreu no julgamento do ARE nº 884.325 pelo Supremo Tribunal Federal, decidindo que a regulação do segmento sucroalcooleiro através de controle de preços não implicaria em dano indenizável às pessoas jurídicas. 

Grave é a fundamentação do voto do Relator Ministro Fachin, que afirma “a mera limitação do lucro não consubstancia dano injusto, e como tal, não dá direito à indenização”. Essa afirmação beira o período da irresponsabilidade, quando não existia responsabilidade civil pelos atos dos monarcas, conhecido através do adágio inglês “the king can do no wrong”. 

Entender como restou fundamento na decisão é permitir que o Estado exproprie os resultados da atividade econômica por meios não previstos na Constituição. Ora, se você proíbe através de regulação a prática de preços em determinado patamar obviamente existirá o dano in re ipsa em razão do prejuízo no resultado financeiro da exploração da atividade econômica. 

Seguindo essa linha de raciocínio, permissa venia, percebe-se que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal ofende tanto as normas constitucionais e legais delimitadoras do exercício do poder-dever de regulação estatal, como, via de consequência, ao direito líquido e certo ao livre exercício da atividade econômica sob a garantia de tais normas moduladoras da atuação governamental, direito líquido e certo que se assenta na cláusula pétrea do artigo 5º, inciso II, e no também fundamental preceito enunciado no artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal. 

Em razão desta falta de sensibilidade dos órgãos públicos temos nossa indústria nativa da cana-de-açúcar sufocada por décadas (desde a criação do IAA por Getúlio Vargas) onde para se produzir ou comercializar precisa-se não apenas de cumprir a lei e a iniciativa de empreender, mas sim pedir autorização ao Estado (em suas várias esferas federativas) para existir. 

Não podemos esquecer que a produção e a comercialização de combustíveis são consideradas como atividades econômicas estratégicas, porquanto importantes vetores da força motriz impulsionadora do desenvolvimento do Brasil. 

Por tal caráter estratégico, essas atividades reclamam (impõem) atenção aos governantes, mormente com o escopo do fomento ao desenvolvimento econômico nacional, na ambiência da salutar política de incentivo ao crescimento da indústria brasileira e de sua tecnologia na produção do etanol, em harmonia com a preservação do meio ambiente, com reflexo positivo, também, no progressivo ganho social. 

Tomando como base essa atuação governamental, destaca-se, com conjugação com os demais dispositivos constitucionais, o artigo 174, caput, da Carta Maior: “Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado[...]”. 

Nesse passo, ficando claro que as normas constitucionais acima destacadas buscam projetar a garantia da livre iniciativa, deveria o Estado atuar no setor econômico de combustíveis provocando estímulos quanto ao consumo do etanol em predomínio sobre o consumo da gasolina, com o escopo da preservação do meio ambiente, aliada ao fomento da indústria e da tecnologia brasileira em matéria de biocombustíveis, em respeito às empresas empreendedoras e produtoras de etanol no Brasil. Mas, infelizmente, a realidade que presenciamos em relação ao mercado sucroalcooleiro em nosso país é um desequilíbrio que inviabiliza a produção. 

Resultado de tudo isso: temos um parque industrial que poderia estar ativo e diversificado em todo o Brasil gerando divisas através de importações e do comércio local de energia renovável, mas que foi reduzido a uma massa de empresas em recuperação judicial ou falência pela regulação sem o efetivo controle da obtenção das finalidades da norma regulatória. 

Dentro desse drama temos milhares de pessoas desempregadas e empresários que não conseguiram manter a continuidade de suas atividades em razão da pobreza intelectual dos titulares do poder. 

O mais grave é termos nossa Suprema Corte desconsiderando o seu papel de proteger a Constituição e julgando que o poder extroverso do Estado pode inclusive influir na atividade econômica sem qualquer responsabilidade civil. Ou seja, para existirmos temos que pedir autorização ao Estado!

* Artigo produzido em parceria com Felipe de Moraes Andrade.


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