Os problemas socioeconômicos de João Pessoa e como começar a resolvê-los

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A cidade de João Pessoa, conhecida pelas belas praias e paisagens, além de abrigar o ponto geográfico mais oriental das Américas, que faz com que os pessoenses sejam os primeiros a ver o nascer do sol, possui aspectos socioeconômicos que exigem um planejamento sério e embasado para que se possa desenvolvê-la consistentemente. A capital paraibana requer um enfoque de longo prazo que tem se mostrado escasso nas políticas dos últimos anos, o que possibilitará não apenas a mera geração de empregos medianos, mas uma evolução na qualidade de vida e na renda média de seus habitantes, fugindo do inchaço do funcionalismo público.

Existem pelo menos quatro problemas fundamentais em João Pessoa, dos quais deriva uma série de outros menores, que impedem a cidade de sair da mesmice demagógica de gestores simplórios. O primeiro deles é a baixa renda média do setor privado, que pode ser constatada não apenas por pesquisadores, mas pelos próprios cidadãos, que constantemente se lamentam entre si pela falta de oportunidades profissionais consistentes, não obstante uma boa formação em universidade local. A capital brasileira com menor média salarial em seu setor privado é João Pessoa, com apenas 2,8 salários mínimos.


Fonte: elaboração própria (IBGE).


É preciso considerar, no entanto, o fato de essa mesma cidade ter o oitavo melhor custo de vida entre todas as capitais brasileiras, o que faz com que o baixo salário compre mais bens do que compraria se se considerasse a média de preços de várias das capitais desenvolvidas do país. O gráfico abaixo mostra em quantos % cada capital possui seu custo de vida mais caro em relação à capital com menor custo de vida (Belo Horizonte = 100%).


Fonte: elaboração própria (custodevida.com.br).


Ainda assim, amarga a sétima pior posição em termos de renda média do setor privado sobre custo de vida:

Fonte: elaboração própria.

A referida conjuntura se mostra ainda mais grave quando se analisa a média salarial dos setores econômicos da Paraíba, com os maiores patamares concentrados em serviços públicos, o maior patamar privado situado no setor financeiro, marcado por oligopólio, e as indústrias extrativa e de transformação com salários médios abaixo de 2 salários mínimos (na Paraíba a indústria criativa, baseada em pesquisa e desenvolvimento, é a mais mal paga do Brasil, representando pouco mais de metade da média nacional), evidenciando o fracasso de políticas tradicionais em favor de atrair grandes empresas para a cidade ou para o estado, pelo fato de empregar paraibanos e pessoenses em cargos de baixo escalão, tendo em vista a baixa qualificação da mão de obra local, e trabalhadores de outros estados em cargos de alto escalão:


Fonte: elaboração própria (IBGE).


Tal realidade pode ser explicada, entre outros fatores, pelo segundo grande problema da cidade: a escassa qualificação de sua mão de obra, que é evidenciada pelo péssimo desempenho de sua rede pública de ensino, onde há mais de 60.000 alunos matriculados, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, estando na quinta pior posição no ranking do ensino fundamental 1 e na sétima pior no fundamental 2, considerando as capitais brasileiras na avaliação mais recente.


IDEB - fundamental 1
Fonte: elaboração própria (MEC).


IDEB - fundamental 2
Fonte: elaboração própria (MEC).


O salário é a remuneração do trabalho e é função da produtividade do trabalhador (modelo econômico Clássico: W = f(Pmg)), sendo o salário médio uma função da produtividade média dos trabalhadores. A produtividade do trabalho é um conceito definido pela capacidade de produzir mais com menos recursos econômicos, que é conseguida com avanço tecnológico, aprendizado de novas técnicas laborais e, sobretudo, com qualificação. Para que este último recurso seja obtido é preciso haver em primeiro lugar uma base intelectual sólida, que possibilita o ingresso numa universidade de qualidade e a conseguinte formação superior, que pode ser seguida por pós-graduações. Sem ensino básico de qualidade o caminho para a formação superior agregadora de salário se torna muito mais difícil e improvável, levando os alunos mais pobres (maioria) a ingressar em universidade por cotas, em que há maiores índices de reprovação, que leva ao mau uso do tempo e dos recursos públicos, ou a simplesmente ficar de fora da academia.

O terceiro grande problema é a dependência da cidade em relação ao setor externo, apresentando sucessivos déficits em sua balança comercial, ou seja, volumes maiores (consideravelmente) de importações em relação aos de exportações. Isso evidencia a fraqueza dos setores econômicos internos de João Pessoa, ressaltada também pelos resultados da Paraíba, que apresenta grandes déficits comerciais (mais de 11 vezes maior por vias internas do que por externas), sobretudo em comércio varejista e atacadista com outros estados e em bens industriais com outros países, importando a maior parte dos produtos não de um estado de região mais desenvolvida, como sul, sudeste ou centro-oeste, mas de um estado nordestino vizinho: Pernambuco (não há dados disponíveis sobre a balança comercial de João Pessoa com outras cidades e estados).


Saldo da balança comercial de João Pessoa com outros países
Fonte: elaboração própria (MDIC e BCB).


O quarto grande problema é a série sucessiva de superávits primários do governo municipal (receitas menos despesas), em média de 15% das receitas. Resultado positivo no saldo das contas públicas nem sempre é sinônimo de finanças consistentes. Se um governo não utiliza parte relevante de seu superávit primário para arcar com o pagamento de sua dívida, como é o caso de João Pessoa nos últimos anos, isso implica que há excesso de arrecadação, o que significa que está se tirando recursos em excesso do setor privado, em geral mais eficiente em alocá-los, gerando empregos, empreendendo e investindo.


Resultado primário do governo de João Pessoa
Fonte: elaboração própria (PMJP).


Dívida ativa contraída pelo governo de João Pessoa, gastos com sua dívida acumulada e seus investimentos
Fonte: elaboração própria (IBGE).


Considerando o evidente excesso de receita do governo municipal e ainda tratando sobre a configuração das contas públicas pessoenses, é possível notar que, dos três principais impostos municipais, Imposto sobre Serviços de qualquer natureza (ISS), Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), o ITBI indica ser aquele com maior possibilidade de redução de alíquotas, tendo em vista o fato de a cidade arrecadar quase o dobro em termos per capita que a média de 10 cidades com características análogas às suas.


Arrecadação de ITBI per capita
Fonte: meumunicipio.org.br.


Arrecadação de ISS per capita
Fonte: meumunicipio.org.br.


Arrecadação de IPTU per capita
Fonte: meumunicipio.org.br.


Ademais, analisando a produtividade dos gastos públicos do governo de João Pessoa, ou seja, o quanto de resultado positivo é obtido para cada real gasto, em quatro áreas principais, saúde, educação, saneamento e segurança pública, é possível constatar que os dispêndios mais produtivos são em segurança pública e saneamento, sobretudo este último. Isso porque a cidade superou a mediana da produtividade das demais capitais brasileiras. Já em saúde e educação a produtividade dos gastos públicos pessoenses se mostra abaixo da mediana.


Indicador de produtividade do gasto público
Fonte: elaboração própria (Macroplan, Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Trata Brasil e prefeituras municipais).


Os valores foram calculados com base no indicador de resultado das respectivas áreas sobre o gasto per capita de cada governo municipal nelas. Para medir o resultado de saúde e educação foi utilizada a metodologia da Macroplan, levando em conta o percentual de matrículas em creche e pré-escola e o desempenho no IDEB no caso da educação e taxa de mortalidade prematura por doenças crônicas não transmissíveis, proporção de nascidos vivos de mães com sete ou mais consultas de pré-natal, percentual de cobertura da população por equipes de atenção básica e taxa de mortalidade infantil no caso da saúde; para segurança pública foi utilizado o indicador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, baseado nas estatísticas por 100 mil habitantes de feminicídio, homicídio doloso, latrocínio, morte decorrente de intervenção policial, lesão corporal seguida de morte, entre outros crimes violentos intencionais, para cada estado sobre o mesmo indicador para sua respectiva capital, a fim de captar o desempenho das capitais em relação a seu estado, tendo em vista o fato de as polícias serem competência estadual e influírem bastante na segurança das cidades; e para saneamento foi utilizada a metodologia do instituto Trata Brasil a fim de captar os dados sobre investimentos no setor nos últimos 5 anos e a da Macroplan para quantificar os resultados do setor, levando em conta os índices de esgoto tratado, perdas na distribuição de água, atendimento de água, cobertura de coleta de resíduos domiciliares e atendimento de esgoto. Todos os referidos indicadores foram calculados em 2018.

Provavelmente seria edificante o reajuste dos gastos públicos de João Pessoa com base na mediana dos gastos das demais capitais, caso a produtividade do setor justifique adequação. Utilizando tal pressuposto, elaborei os seguintes critérios: 

1- gasto no setor igual à mediana: sem alterações;

2- gasto no setor maior que a mediana com produtividade igual ou acima da mediana: sem alterações;

3- gasto no setor maior que a mediana com produtividade abaixo da mediana: reduzir gasto no setor até se igualar à mediana;

4- gasto no setor menor que a mediana com produtividade acima da mediana: aumentar gasto no setor até se igualar à mediana;

5- gasto no setor menor que a mediana com produtividade igual ou menor que a mediana: sem alterações.

Segue o quadro mostrando quais volumes de recursos seriam alterados com base na diferença entre o gasto per capita de João Pessoa em cada área e a mediana do gasto per capita das capitais brasileiras:


Fonte: elaboração própria.


Na área de educação, por possuir uma produtividade abaixo da mediana e gasto menor que a mediana, e na área de segurança pública, por possuir produtividade igual à mediana, não houve simulação de reajuste. Seriam economizados R$ 34.810.932,72 por ano apenas com a otimização dos principais setores da administração pública municipal, gerando ainda mais margens para redução da arrecadação, mantendo o dinheiro em posse da livre iniciativa.

O caminho para solucionar os grandes problemas de João Pessoa deve passar pela otimização dos recursos públicos, reduzindo despesas improdutivas, aumentando despesas produtivas, suprimindo excessos de arrecadação e gerando assim mais capacidade de investimento e consumo do setor privado; pela melhoria da qualidade do ensino básico, a fim de aumentar a qualificação da mão de obra pessoense, que aumentará a renda média da população e possibilitará menor dependência da cidade para com o setor externo, por meio do aprimoramento da atualmente combalida indústria criativa local, por exemplo; e pela delegação, no maior grau possível, das áreas menos produtivas do setor público municipal ao setor privado, seja por meio de privatizações, concessões ou Parcerias Público Privadas (PPPs).


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