Direita e Esquerda: por que essa terminologia é falha para descrever os espectros políticos

Depois de um bom tempo distante do imaginário popular, na última década voltamos ver o embate popular entre as visões nomeadas como direita e esquerda. Obviamente, isso não significa que em outros períodos, no Brasil, não houvesse pessoas em todas as esferas da sociedade se posicionando de um lado ou de outro, principalmente à esquerda, dado um longo período hegemônico, por outro lado, com a ocupação veemente de um contraponto à hegemonia, a discussão do tema voltou a ocupar o imaginário popular.

Contexto Histórico

Os termos “esquerda” e “direita” entraram no repertório político após a revolução francesa (1789), nos parlamentos formados por toda a França entre 1789 e 1799 eram organizados de forma que os representantes da aristocracia se sentavam à direita, conhecidos como girondinos, e os comuns, à esquerda do orador, denominados de jacobinos. Nesse momento da história, o foco da discussão política estava na divisão de classes e nos privilégios (entenda-se “classe” aqui como grupos que possuem direitos e deveres diferentes perante a lei, como a nobreza ou o clero, por exemplo, e não classes sociais do ponto de vista econômico). A essa época, o que se entendia como esquerda e direita possuía muitas diferenças do que entendemos hoje, uma vez que a discussão estava muito mais voltada para interesses de grupos sociais: os aristocratas à direita e os burgueses, que acabavam de emergir com a ainda incipiente revolução industrial.

Esquerda x Direta hoje

As bandeiras se misturaram e diversas correntes de pensamento foram adicionadas nessas duas categorias, que muitas vezes acabam sendo complicadas, pois algumas correntes podem ser consideradas em uma categoria num país e em uma diferente noutro, por outro lado, se entende que há pelo menos alguns traços em comum que diferenciam ambos (Direita e Esquerda). Por exemplo, o militante ou intelectual comum de esquerda é tipicamente um jacobino. Acredita que o mundo é deficiente em sabedoria e justiça, e que a falha reside não na natureza humana, mas nos sistemas de poder estabelecidos, onde, através da política, encontrar-se-á a "salvação", o dito paraíso na terra. Ele se opõe ao poder estabelecido, como o defensor da "justiça social", cuja visão de humanidade está reduzida em cadeias de exploração e somente por um processo de ruptura institucional isso pode ser quebrado. Ele é facilmente mais atraído por uma visão utópica da realidade. O que se encaixa muito bem no que diz Roger Scruton em Pensadores da Nova Esquerda, P.18: 

"A história da esquerda é a expressão da mentalidade em apuros, e somente quando reconhecemos isso podemos perceber sua estrutura essencial como um mito. Ela toma o autoengano heroico de uma Beatrice Webb a viajar no sombrio mundo do comunismo e vê nada senão luz. Mas intelectuais menos talentosos podem, ainda, apropriar-se do passado e remodelá-lo de acordo com a necessidade da doutrina. O "clima de traição" dispersou-se; mas permanece o anseio por um propósito de redenção mundial, aquele que estabelecerá finalmente o império da justiça social. Aqueles que tentam chamar a atenção para fatos inquietantes, ou que dizem que "justiça social" pode ser intrinsecamente indesejável, são ignorados ou demonizados, e tudo o que aconteceu nas décadas recentes de forma a mudar as mentes dos homens não comprometidos deixou a mentalidade socialista impassível".

Já conforme a visão de mundo de alguém de direita acredita-se em governo responsável, na autonomia e personalidade das instituições e no Estado de direito. Entende-se que há uma distinção entre Estado e sociedade civil, onde o segundo é fruto da interação livre de indivíduos contrastantes, mediados pelos costumes, a tradição e o respeito por autoridade e pela lei. Para os direitistas, poder, por si, não é um mal desde que não haja algum abuso. Pois o poder é fruto da interação humana, e é meramente a consequência irrepreensível de um acordo cujas virtudes estão por toda parte.

A relação direitos e deveres também é muito clara na mente direitista. Entende-se que existem direitos que o indivíduo já possui simplesmente por existir, independente de alguma lei: direitos de propriedade, liberdade e vida. Ele também tem deveres e responsabilidades: deveres de acordo com a lei do contrato, delito e crime. Scruton elucida isso mostrando como países que não possuem uma clara visão de mundo sobre direito e responsabilidade estão propensos a desastres ambientais:

"A fábrica que polui um rio pode, então, ser compelida a indenizar aqueles que sofreram. Ela pode ser acusada por um crime e multada ao ponto de falir. (Não deveríamos nos surpreender, portanto, que problemas de poluição ambiental sejam muito piores no mundo pouco produtivo dos governos comunistas do que no mundo superprodutivo da empresa privada.).

A grande questão é que diversos movimentos, ora alçados à direita, ora à esquerda, misturam características elencadas pelos dois lados, ou possuem bandeiras que não pertencem a nenhum. Por exemplo: no Brasil, na década de 30, surge o movimento integralista brasileiro, que, pelo mainstream midiático, é classificado como extrema direita. Eles até defendiam algumas bandeiras semelhantes, como a propriedade privada, o resgate da cultura nacional e um certo nível de moralidade, embora fosse um modo bem extremado, próximo de um moralismo. Por outro lado, eram contra a liberdade de mercado, a favor do corporativismo, e era fundado como um movimento sindical.

Por isso que considero visões como Conservadorismo (e suas vertentes), Liberalismo (e suas vertentes), Nacionalismo, Social-Democracia, Anarquismo, entre tantos outros, movimentos que possuem certa complexidade filosófica e histórica para ser simplesmente divididas em dois lados. Muito mais interessante seria abarcar e classificar as visões políticas como correntes independentes que são; mesmo que em um momento ou outro da história duas ou mais delas estejam alinhadas, mas o alinhamento, por si só, não significa tanta coisa assim.


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